segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

" Roque Santeiro, Contemporânea E Providencial !


Querido leitor:

É comum observarmos pessoas associando experiência a idade, ao aspecto temporal, para justificar aquisição de conhecimentos, ledo engano porque quase sempre a palavra experiência vem de experimentar, para definir essa aquisição, sendo assim, nem sempre quem experimenta muito tem mais experiência do que aquele que experimentou menos, conheço pessoas que vivenciaram situações por menos tempo e são mais experientes do que quem experimentou por mais tempo. É a tal da inteligência específica que nos habilita a sermos capazes de realizar determinadas coisas. Diante dos meus quase cinquenta anos de idade, bem vividos em termos de aventuras e alegrias, deixando as tristezas de lado, pude adquirir muito conhecimento no campo emocional e por isso sempre fui impulsionado pelas novelas de antigamente, como a magnífica e bem elaborada, Roque Santeiro.
Não quero desmerecer as atuais ou me tornar um saudosista inveterado, apenas entendo, diante da minha personalidade, que as coisas estão mais pueris e muito descartáveis ao passo que em tempos pretéritos as coisas eram bem mais românticas e fieis. As novelas sempre tratam de assuntos diversos e a emoção está a frente de tudo (é o que move esse filão social) e os temas são diversos e providenciais, quando digo que hoje são mais pueris é pelo fato de as mesmas tratarem os assuntos como nós vemos a todo momento nas ruas, por exemplo, sem a necessidade, por vezes, de serem tão elucidativas e agressivas. Antigamente as novelas eram de extremo bom gosto e tratavam dos assuntos que estavam intrínsecos na sociedade, basta observarmos em Roque Santeiro algumas personagens interessantíssimos. Vejamos:
Roque Santeiro (José Wilquer), foi transformado em mito por um povo carente de informação e muito aquém da realidade dos fatos (como ainda acontece nos templos religiosos de hoje em dia), o que acabou levando a uma turbulência local diante de uma fé vazia e, ao retornar a cidade, vivo, e descoberto por alguns, passa a ser uma ameaça aos rumos dessa sociedade que vive em prol dessa fé desrazoada. Já o padre Hipólito (Paulo Gracindo) passa a rever os seus conceitos e crenças por entender que a volta de Roque joga por terra toda uma pseudo-verdade criada pela sua religião secular e, em contra partida, passa a ser mais flexível quanto ao entendimento de si e do próximo. Outra personagem que me chama muito é o da Dona Lulu (Cássia Kiss), uma mulher atormentada e tolida da liberdade pelo marido autoritário e doente Zé das medalhas (Armando Bogus - excepcional ator) que a quer em casa, dentro do quarto, e vive da fé dos nativos de Asa Branca para vender suas medalhas e símbolos religiosos, que o tornaram um homem rico, já a Lulu, mulher apaixonada e carente, está em busca de si mesma por não ter identidade e vive "vagando" em seus sonhos. Personagem interessantíssimo para estudos psicanalíticos, eu diria. Outro e principal é o Sinhozinho Malta (O magnânimo e magnifico ator Lima Duarte) que é um verdadeiro canalha, assassino, corruptivo e mandão, porém, apaixonante pelo seu carisma de homem apaixonado, vive dando ordens e designando os destinos das pessoas e da cidade (acho maravilhoso quando ele senta a cadeira do prefeito), ao passo que fica atormentado pelo suicídio da ex-mulher por tê-lo visto com a viúva Porcina (Regina Duarte) que também é o ponto central da trama, mulher sofrida e angustiada por ter visto a mãe ser assassinada e venceu na vida a custa de muita humilhação, também vive dando "seus pulinhos" com romances rápidos e fúteis porque possui a mesma "doença" do seu grande amor, Sinhozinho Malta. É outra personagem apaixonante na grande atuação dessa ótima atriz. O prefeito e submisso marido da D. Pombinha (A Excelente atriz Heloísa Mafalda) , o senhor Florindo Abelha (Ary Fontoura) está as voltas com o aparecimento de seu grande amor do passado e também é um "banana" sem iniciativa e dependente dos outros pra tudo. O padre Albano (Claudio Cavalcante) é um ser em ebulição entre a fé e sua vida de homem comum que acaba se apaixonando pela bela Tânia (Lídia Brondi), filha de sinhozinho Malta, menina mimada e em busca de um grande amor, nos dá uma lição de vida ao se dedicar as causas nobres e querer ser um homem como outro qualquer que ama e é amado, constituir família mas a religião e suas contradições o impedem.
Bem, diante dessa síntese de como funciona essa lindíssima novela do Dias Gomes que, diga-se de passagem, é bastante atual para quem foi escrita a quase trinta anos atrás, espero que possamos entender que as sociedades não evoluíram tanto assim porque ainda hoje encontramos essas personagens, na vida real. Tomara que ao terminar possam vir outras do gênero, assim como: D. Xepa, Casarão, Estupido cupido, Marrom glace, Elas por elas, Te contei?...

Isso sim era novela...

Iran Damasceno.


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